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Mostrando postagens de dezembro, 2015

9. A Garota da Vitrine

“Não me encontro com ninguém (tenho fases, como a lua...) No dia de alguém ser meu não é dia de eu ser sua...” (Lua Adversa, Cecília Meirelles) Lucas foi interrompido por batidas na porta do banheiro. - Guri! Você está bem? – Tudo em Ana Rosa exigia uma resposta. Como se despertasse de um transe agoniante, Lucas soltou a gilete na pia e abriu a porta. Ana Rosa o olhou, preocupada. - Cruzes... Você está mais magro do que nunca. Está se alimentando direito, Lucas Matarazzo? - Tudo o que eu como acaba voltando. – Diz ele, amargo. - Acho que o monstro está com raiva... - Seja forte. – Diz Ana Rosa. – Você está aguentando bem. Só mais duas noites e então só terá que enfrenta-lo de novo no próximo mês. E até lá poderá se preparar, se fortalecer. - Ainda tem mais seis meses. - Acrescenta Lucas, sem conseguir esconder o desânimo. Ele se perguntou se realmente aguentaria. Se perguntou se não enlouqueceria e rasgaria os próprios pulsos para sangrar até morrer na

8. Se você me ama, não vai me deixar saber?

“Sobre nós dois: Ninguém nunca vai saber de tudo” (Autor Desconhecido) Briana Brigantia deu mais uma volta na frente do espelho da loja. O vestido rosa havia lhe caído muito bem, e ela sabia disso. - Você parece uma Barbie – comenta Edna, uma colega de classe que era a pessoa que mais idolatrava Briana no mundo. – Sério. Você tá tão perfeita que me dá vontade de chorar. Briana sorri, ainda se admirando no espelho. - Ah, Edna... Obrigada. Eu não me importo se você chorar. Eu entendo, de verdade. - Nossa, eu tenho tanta sorte por ser a sua amiga – funga Edna. Briana concorda com a cabeça. - Sabe, Edna, eu me inspiro na Barbie porque ela é perfeita e consegue tudo o que quer. E nesse momento o que eu mais quero no mundo é que o Fernando me veja assim e também chore. Edna seca a beirada dos olhos com os dedos, mesmo não havendo nenhuma lágrima ali. - Jura, amiga? Você gosta mesmo dele? - Eu gosto – concorda Briana, dando voltas pelo corredor dos provadores. –

7. Os Lobos Caem Matando

“Monstros são reais e fantasmas são reais também. Vivem dentro de nós e, às vezes, vencem.” (Stephen King) Ana Rosa Arabella encostou a caminhonete na mesma encruzilhada da véspera, sob os primeiros raios de sol da manhã. Lucas já estava lá, terminando de se vestir com as roupas que havia trazido na mochila. Estava ofegante e com o rosto um pouco arranhado, e havia sangue seco nas mãos e na boca dele. Ana Rosa percebeu com tristeza o quanto ele parecia abatido. Se aproximou e ofereceu uma garrafa de água mineral gelada. - Pegue. Beba e se lave. Lucas aceitou sem dizer nada, despejando a água fria sobre a testa suada e o cabelo embaraçado. - Onde você acordou? – Perguntou Ana Rosa, olhando em volta. - No meio da trilha, como você disse. – Respondeu o garoto, com ar cansado. A mulher o encarou. - Viu? As coisas estão dando certo, guri. Sei que é difícil, mas você está conseguindo. Não machucou ninguém, e isso é importante... - Mas também não tenho controle

6. Maçã do Amor e A Primeira Encruzilhada

“Já matei alguns sentimentos, mas foi em legítima defesa” (Zack Magiezi) - Quer maçã? – Pergunta Violeta. Lena ergue os olhos do celular. - Não, obrigada. Violeta sacode os ombros e crava os dentes na maçã vermelha. E mastiga. Ela olha para o outro lado do refeitório. Lena segue o olhar dela. - É, parece que agora você pode encará-lo. Ele nunca vai ter coragem de olhar pra você de novo. Lena falava de Fernando, claro. E apesar do tom usualmente azedo e zombeteiro de Lena ser para Violeta a melhor qualidade da amiga, doeu daquela vez. Talvez ela tivesse se precipitado. Talvez Fernando fosse apenas um rapaz bonito e tímido que a achava bonita, mas ainda estivesse criando coragem para falar com ela. Talvez ela tivesse arruinado qualquer chance de conhecer melhor o garoto, e em fim descobrir suas reais intenções. Violeta balança a cabeça. - Não é justo, Lena. Por que eu sinto como se tivesse perdido algo? Eu não deveria estar feliz por ele parar de me encara

5. Eu quero estar onde os garotos estão

“O critério ‘atitudes estranhas’ não dá para condenar pessoas criaturas com entranhas.” (Paulo Leminski) - Que diabos foi isso? – Perguntou Violeta, ao ouvir o estrondo vindo do andar de cima. - Fiquem aí – disse Ana Rosa, mais ou menos adivinhando do que se tratava e subindo a escada do porão de três em três degraus. – Não quebrem o círculo, ainda não terminamos! Me esperem exatamente aonde estão. Lena e Violeta deram de ombros. Sempre aconteciam coisas estranhas na Pensão, e não era nada saudável desobedecer Ana Rosa nessas ocasiões. - Nós já terminamos o ritual. – Diz Lena, mordendo o lábio inferior. – Podemos fechar o círculo, se quisermos. - É verdade – concordou Violeta. – Ela já nos ensinou isso. Mas nenhuma das duas se mexeu.

4. Ritual de Purificação

“Lua crescente o escuro cresce a estrela sente” (Paulo Leminsk) Já estava escurecendo quando Fernando saiu da igreja, acompanhado pelo pai. Edgar Bragança era um homem alto, de boa musculatura, fisionomia séria, cabelo e cavanhaque pretos e olhos também escuros. Com exceção da cor dos olhos, era um perfeito Fernando de 40 anos, i nclusive na frivolidade com que parecia encarar o mundo. Os dois entraram no carro prata estacionado na rua, em silêncio. Edgar concentrado em manobrar o veículo. Fernando com aquele ar distante de sempre. - A tarde hoje foi proveitosa. – Diz Edgar, quebrando o silêncio. – Evento beneficente, planos para a novena e a reunião da Ordem. Fernando assentiu, em silêncio. Edgar desviou os olhos da estrada e olhou para o filho por um momento. - Eu já ia me esquecendo... – Começa ele. – Tem uma coisa pra você aí. Fernando o encara com interesse, depois abre o porta-luvas. Era um caderno pequeno, encapado com couro. - Pra que isso? – Perg

3. Pirulito de Cereja

“Cereja agridoce o que tiver de ser você seja.” (Alice Ruiz) Como combinado, Jaime foi encontrar as meninas na porta da Pensão para irem juntos ao colégio, exatamente às sete da manhã. Ele deu um selinho em Lena e os três desceram a rua na direção do colégio. Jaime com seu skate e as duas logo atrás, de braços dados. - Vamos assim, como boas colegas. – Propõe Violeta, e Lena ri. - Ótimo. Vamos espalhar mais a nossa fama de namoradas. - Macumbeiras namoradas. – Corrige Violeta. – Não pode existir coisa melhor. *** Na hora do intervalo, Fernando saiu da aglomeração da cantina com a latinha de refrigerante nas mãos e se dirigiu para o pátio, sozinho. Ele gostava da solidão. Do silêncio que permitia que ele escutasse os próprios pensamentos. E, claro, podia se entregar ao seu passatempo secreto: observar a garota do cabelo castanho, também conhecida como Violeta. Mas onde ela estava? Talvez ela o estivesse evitando. Não que ela desconfiasse que ele sabia mai

2. A Dama das Rosas

“Se você quer uma rosa vermelha, terá de fazê-la de música, ao luar, e tingi-la com o sangue do seu próprio coração.” (O Rouxinol e a Rosa, Oscar Wilde) - Obrigada pela carona! – Agradeceu Ana Rosa. O motoqueiro fez um gesto cordial e buzinou antes de arrancar, fazendo barulho na rua quase escura. Ana Rosa pegou a chave no bolso do avental e destrancou o cadeado do portão de ferro. Olhou para o seu impecável jardim, com satisfação. Amava as suas rosas na hora do entardecer mais do que nunca, quando o perfume delas subia e impregnava tudo, e todas as cores se despediam dela antes de se perderem no manto negro da noite. Ela se dedicava ao jardim. Era preciso que as flores a amassem de volta. Era preciso que todas elas fossem regadas com seu próprio suor, seu sangue, suas lágrimas. Era assim que se fazia um vínculo verdadeiro. Escutou passos atrás de si, e se reprendeu no mesmo instante por sua distração. Nunca esqueça o portão da Pensão Arabella aberto...

1. Sapatos Vermelhos

"Quando eu era criança costumava rezar: Deus, faça de mim uma bruxa." (Nicole Kidman) Era tudo culpa da Lena. Disso Violeta tinha certeza, enquanto andava de um lado para o outro, impaciente, com as mãos enterradas no bolso do vestido jeans. Lena-estúpida-melhor-amiga havia esquecido completamente de deixar a chave com ela, e, pra ajudar, não atendia ao celular. No mínimo estava em algum lugar se agarrando com o Jaime. Era a maldição da melhor amiga que começa a namorar. Se Violeta pudesse, interromperia os dois agora mesmo, independente do que estivessem fazendo. Ela sabia muito bem como ser inconveniente quando queria. Olhou para o portão gradeado da Pensão. Pular não era uma opção. Nem pensar. Estava de salto alto. Sapatos vermelhos idiotas, mas muito lindos. Não ter uma vida social ativa a obrigava a ter que usá-los em ocasiões totalmente nada haver, já que era preciso compensar a fortuna que eles haviam custado usando-os ao menos uma vez por s